4.3.06

Ainda o tempo

Não, ainda não
vicejar do dia de me esperar tranquilo
caminhar no meu passo
ao lado o tempo
percebendo a troca das horas.

Não, ainda não
nem sequer distinto
longe
nem sequer descrito
só desejado
e olha que não por pouco se que tanto lhe aproximasse a vinda
tanto quanto não vê-lo e ainda
inda que baste
(mas não basta).

Não há trégua em nada que deus me queira destinado
(e tudo se lho cumpro a risca)
na vida parca, nada tem glória
nem o prazer em sobressaltos
feito fera no bebedouro entre outras feras
como as minhas próprias, perenes
com sensoras garras rasgando frestas nas paredes
do íntimo aonde moro cada pouco do meu gôzo.

Mas é feliz o depois
onde, furtado no retroz da mente
saudoso do andar tranquilo de todo momento
de lado com o tempo
na troca das horas...

mas são horas já mortas.

A roca das Parcas (1995)

O Poema só existe sob os olhos de medusa do leitor

Aquí alguns escritos sobre o tempo.


Que se cumpra o fato
o rumorejar do vento
eternamente
Que se cumpra a morte
e o dom supremo
de cavalgar a existência
Que se cumpra tudo
como na alma-desejo.
(1992)


Da sacada do teatro de mim mesmo
alcei vôo leve, insandecido
palco-fortaleza do meu corpo
assim abandonado e esquecido
Dos olhos da máscara de mim mesmo
quedou-se a lágrima leve distraída
cego órgão inútil do meu rosto
da tristeza de memórias mal vividas.
(1992)

Os anos passam e vergam os galhos
da velha árvore sagrada
na senda da história plantada
entre curvas abismos e atalhos.

(1989)

Hoje sou vindo
antes não era
e assim chegado
quedo-me não por cansaço
poluído me levanto
e assim erguido
(sacudida a sílica agora inútil)
assim desprendido
olho e me encando
com o já vivido.
(1992)

De amar e desamar
se faz meu caminho
De amar e desamar cada coisa
Um olhar baço
desdenhoso do existir.
Barca sem porto
vontade angelim
sólida dos anéis de muito ontem.
Quilha mordaz da barca carôntida.
Página limítrofe do pensamento
Espátula de retirar o teor dos anos.
Coração mesopotâmico
que verte minhas indecisões mais queridas.
(1992)