20.1.10

A segunda híbris

A incógnita me burla onde quer que eu possa suspeitá-la.
Assim que a percebo na sombra dos móveis ela se torna uma meia, camisa torcida, um trapo, qualquer coisa que expresse inocência fingida. Ela também se oculta nas novas manchas da parede depois da chuva. Se infiltra nos recôndidos, me aguarda num cesto. Mimetiza-se entre os pêssegos ou na tapeçaria pendurada no vão das portas. O que resguarda a memória do tronco de uma árvore alí se enrosca em volutas atávicas de quem há muito só sabe tocar as coisas com o todo de seu corpo. Pendura sua cabeça triangulada como o fiel da balança; assim todos os pêndulos me assustam como se ela os possuísse. Ela está na maneira como os líquidos viscosos se derramam. Ela mesma derrama-se em queda surda. O ar suspenso em meus pulmões ajuda-me na petrificação diante de sua sinuosidade. Só assim a percebo além de sua contenção; fugindo à sua constrição.
Petrificar-se é adormecer e também estar alerta à sua especificidade contínua, contígua.
(postado inicialmente aquí em 7 de dezembro de 2006)

2 comentários:

Raiça Bomfim disse...

Por esse lajedos, eu sigo-a.
Sua escrita tem tanto mistério.


Saudades. Muitas. Que tal um café com história?

Vampira Dea disse...

Vc tem um jeito maravilhoso de escrever.