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3.9.10

A Roda - trajetória profissional

A RODA foi criada em 1997 e é das poucas Companhias de teatro que dedica-se exclusivamente à animação de bonecos na Bahia. Formada por artistas visuais que apreciam animação, A RODA leva aos palcos um teatro eminentemente visual, que fala a todas as idades tanto pela força plástica de seus protagonistas esculpidos em madeira - marca registrada da Companhia - quanto pela temática de apelo mitológico e raiz popular.

Sob a direção artística de Olga Gómez - escultora argentina radicada em Salvador desde 1986 - A RODA já apresentou o seu repertório atual de cinco espetáculos em importantes mostras artísticas no Brasil e no exterior e, em 2008, percorreu 15 estados e 55 cidades brasileiras como convidado do projeto Palco Giratório do SESC Nacional, ministrando oficinas e apresentando-se com o espetáculo “Amor & Loucura”. A Companhia foi contemplada com prêmios locais e nacionais de teatro entre eles o Copene na categoria Destaque, ano 1999, e o Myriam Muniz da FUNARTE/Ministério da Cultura nas edições 2006 (Amor & Loucura), 2007 (Ofina de Animação de bonecos) e 2009 (projeto O Pássaro do Sol).

A origem da pesquisa do grupo está na tradicional forma de teatro de bonecos japonês - Bunraku - que se utiliza da técnica de MANIPULAÇÃO DIRETA. Como o nome sugere esta técnica consiste em mover o boneco diretamente através de suas articulações, sem esquecer da neutralidade corporal e da sincronicidade dos manipuladores, que muitas vezes dividem um mesmo boneco. Novas experimentações técnicas e plásticas são permanentemente buscadas pela Companhia


Apresentações, cursos e festivais


2010 junho/agosto “O PÁSSARO DO SOL” - Temporada no Teatro SESI Rio Vermelho, Salvador - Bahia
2010 janeiro/fevereiro - Laboratório gratuito de Teatro de Sombras, 96 horas - MAM-BA e TCA, Salvador - Bahia
2008 abril/outubro - “AMOR & LOUCURA” , turnê nacional pelo projeto do SESC - PALCO GIRATÓRIO - por 15 estados brasileiros (CE, PA, TO, DF, MS, ES, PE, MT, RS, SC, PR, SP, RJ, RO e PB) totalizando 55 apresentações e 176 horas de oficinas de manipulação de bonecos.
2008 junho - FILO - Festival Internacional de Londrina - Londrina - Paraná
2008 janeiro/março - Oficina de Animação de Bonecos, 96 horas - Teatro Castro Alves, Salvador - Bahia
2007 abril/maio - “AMOR & LOUCURA” - Temporada na Sala do Coro - Teatro Castro Alves, Salvador - Bahia
2007 janeiro/fevereiro - “AMOR & LOUCURA” - Temporada no Teatro do SESI, Salvador - Bahia
2006 novembro/dezembro - “AMOR & LOUCURA” - Temporada no Teatro do SESC SENAC/BA, Pelourinho - Bahia
2006 julho “A COBRA MORDE O RABO” - Apresentação pelo Projeto Circuladô Cultural/FUNCEB, C. de Cultura Jequié - Bahia
2006 junho “O COMBATE” - Apresentação peo Projeto Circuladô Cultural/FUNCEB, Espaço C. Alagados - Bahia
2005 julho -“O COMBATE” - Apresentação pelo Projeto Palco Giratório SESC/BA, Pelourinho - Bahia
2003 abril “A COBRA MORDE O RABO” - Projeto Circuladô - Apresentações no Teatro D. Canô Santo Amaro - Bahia
2003 maio - “HISTÓRIAS DA CAIXA” - Projeto Circuladô - Centros de Cultura da periferia de Salvador - Bahia
2002 julho “O COMBATE” - XI Festival Esp. de Teatro de Bonecos de Curitiba, Teatro Guaíra - Curitiba - Paraná
2001 setembro/ outubro - “O COMBATE” - Temporada pelo Projeto A Todo Gás, Aeroclube Salvador - Bahia
2000 novembro “O COMBATE” - Estréia no “Here Arts Center” fazendo parte do “5th Toy Theater Festival”, Nova Iorque - Estados Unidos
2000 setembro/outubro - “A COBRA MORDE O RABO” - Temporada na Sala do Coro Teatro Castro Alves, SSA - BA
2000 junho/julho/agosto - “HISTÓRIAS DA CAIXA” - Projeto A Escola Entra Em Cena - Apresentação para 20 escolas públicas da Rede Municipal de Salvador, Salvador - Bahia
2000 Projeto Pelourinho Dia&Noite - apresentações no Centro Histórico de Salvador , Pelourinho, Salvador - Bahia
2000 janeiro/ fevereiro -“A COBRA MORDE O RABO” - Temporada de Verão no Espaço XIS, Salvador - Bahia
1999 julho/ novembro -“A COBRA MORDE O RABO” - Projeto A Escola Entra Em Cena - Apresentação para 20 escolas públicas da Rede Municipal, Salvador - Bahia
1999 Projeto Nordestes, mostra nordestina promovida pela Fundação Joaquim Nabuco/SESC, São Paulo - SP
1999 Festival Internacional de Teatro de Bonecos de Olinda, representante oficial da Bahia, Olinda - Pernambuco
1999 maio “A COBRA MORDE O RABO” - estréia através da Lei de Incentivo à Cultura FazCultura no Espaço XIS permanecendo em cartaz por três meses. Salvador - Bahia
1997 outubro CURSO DE EXTENSÃO - ESCOLA DE TEATRO DA UFBA, Ministrado pela Doutora em teatro de bonecos pela USP Professora Ana Maria Amaral. Salvador - Bahia
1997 julho/ setembro Participam como festivaleiros dos: FESTIVAL MONDIAL DES TÉÂTRES DE MARIONNETTES - Charleville - França
1997 Festival Internacional de Teatro de Bonecos de Canela, Canela - Rio Grande do Sul


Premiações
2010 janeiro PRÊMIO Manoel Lopes Pontes FUNCEB Projeto O PÁSSARO DO SOL
2009 novembro PRÊMIO FUNARTE de teatro MYRIAN MUNIZ - MinC. Projeto O PÁSSARO DO SOL
2007 setembro PRÊMIO FUNARTE de teatro MYRIAN MUNIZ - MinC. apoio p/ realização de Oficina de Animação
2006 abril/junho PRÊMIO FUNARTE de teatro MYRIAN MUNIZ - MinC. apoio p/ montagem de “Amor & Loucura”
2006 PRÊMIO FUNCEB para espetáculos de médio porte - Governo da Bahia, apoio financeiro para a montagem do espetáculo “Amor & Loucura”
2000 março PRÊMIO COPENE DE TEATRO - Categoria destaque do ano de 99 com “A Cobra Morde o Rabo”
2000 PRÊMIO ESTÍMULO - FUNARTE/ Fundação Cultural do Estado da Bahia com “A Cobra Morde o Rabo”

17.9.08

Acordos

Em 1997, dentre as discussões que se produziam no curso “O Objeto, o ator e a máscara”, ministrado por Ana Maria Amaral na Escola de Teatro da Ufba (e aqui vale ressaltar que este deveria ser um curso iminentemente prático, mas que por um anseio proveniente da carência local (?) por conceitualizações sobre o assunto, algumas vezes deixava de sê-lo) levantei a seguinte questão: O objeto proposto em uma encenação de teatro de objetos que quando em sua animação assume características de um boneco, representando intenções que seriam típicas de um ser vivo humano ou animal, não estaria abandonando sua condição de objeto e, nesse caso, a encenação não estaria deixando de ser teatro de objetos para ser um teatro de bonecos?
Isto surgiu porque uma atividade proposta estimulava os alunos a se apropriarem e animarem um objeto sem características de boneco, um objeto cotidiano. Um aluno escolhe um par de sapatos e o anima repetindo sua função original e propondo que a platéia imagine o ser que calça os sapatos. Ele manteve as características funcionais do objeto, uma reação imediata e natural de quem começasse a investigar um objeto. Aqui a intenção, a simulação de vida, o centro pensante, não estava no objeto, mas no ser que a platéia deveria imaginar.
Em seguida, agora não lembro se foi exercitado ou apenas discutido, outro aluno propôs que os sapatos simulassem intenções diferentes entre si. Uma discussão entre um sapato e o seu par. Ou seja, cada sapato era um boneco.
Não lembro de já ter assistido nenhuma encenação com uma proposta de teatro de objetos que não fosse, em ultima instância, teatro de bonecos. Devo ter assistido pouco. De qualquer forma parece ser uma proposta difícil de ser levada a cabo. O questionamento que fiz surgiu logo depois do segundo exercício com o par de sapatos e lembro da conclusão de Ana Maria: “É, o objeto embonecou!”.
Esta expressão é típica de Ana Maria Amaral que tem, longe de seus preciosos livros que li com a sofreguidão de quem busca ar para respirar, uma forma coloquial de pensar teatro de animação.

Perece que os atores-animadores devêssemos nos preocupar menos com as conceitualizações porque o que é regra em uma encenação deixa imediatamente de vigir em outra. Uma coisa é certa: a investigação prática é necessária. O pacto do ator-animador com seu objeto é diferente daquele estabelecido entre a platéia e a encenação. Um dos entraves de um iniciante está na dificuldade de sair da posição de ‘estar assistindo’. Exercitar diferentes técnicas de animação tentando perceber o valor de suas regras é a única forma de quebrá-las com propriedade e estabelecer comunicação com uma platéia que ou é exigente demais não se deixando levar pelas propostas sejam elas tradicionais (muitas vezes consideradas anacrônicas e chatas) ou experimentais (estas às vezes tidas como “autorais” demais para merecerem atenção) ou está apática por falta de referências, de cultura teatral. Os que se arvoram à arte da animação também sofrem com esta falta de referências e é isso (além das raízes populares do teatro de animação) que fazem dela um processo autodidata.

A mesma dificuldade que Ana Maria Amaral tinha em levar-nos à prática em 1997 repetiu-se no curso de animação que o grupo A Roda ministrou no TCA em janeiro deste ano. Alunos querendo “a fórmula da animação” para avançarem com mais propriedade ao boneco racionalizando os exercícios de introdução. Uma atitude natural diante da possibilidade de sujeição que o boneco parece impor a quem se atreve a animá-lo (o que, no caso específico da experiência da Roda, se vê potencializado pela proposta escultórica de Olga Gomes com seus bonecos e objetos elevados em si à condição de obras de arte). Acredito que esta sujeição só pode ser superada se exercitada. Uma atitude humilde diante do objeto o faz reverter suas especificidades em nosso favor fazendo-o revelar significados que na verdade são nossos e não dele
(Por animismo em algumas culturas a função sagrada, de preciosidade dada ao objeto faz com que ele seja percebido como ‘ser’. Um objeto que participa ativamente na vida desencadeando sentimentos ou sensações em quem o observa ou o conduz recebe, momentânea ou permanentemente, a condição de causador consciente. Como quando xingamos a banqueta na qual tropeçamos acreditando podermos ofende-la). Se existe uma fórmula para a animação ela se esconde no fim de partida do jogo com o simulacro.

O ator-animador assume um acordo com seu objeto. O objeto oferece condições para que o animador imprima o gesto desencadeando a carga dos significados que o animador deseja expressar O animador está sujeito às especificidades do objeto: a personagem e as possibilidades de suas articulações ali fixadas pelo construtor. Este acordo, logo, implica a compreensão, por parte do animador, dos significados do simulacro propostos pelo construtor e que, obviamente pode ir além das intenções desse construtor se, certo de seus conteúdos, este animador (que, nesse caso, é um animador-encenador) alcança seu objetivo de tornar crível para uma platéia o universo ali encenado.
Dar vida ao inanimado é fazer uma platéia concordar que as intenções partem do objeto. Outra forma de encenação poderia propor que o animador saia de sua posição de elemento neutro e participe da cena ainda conduzindo a platéia a acreditar que as intenções partem do objeto. Ultimamente algumas encenações decidem utilizar o objeto como referência e propõem claramente à platéia que este não tem em si nenhuma intenção. O animador apresenta seu objeto como uma alegoria e se assume como ator. Por conseguinte é retirado ao objeto qualidade de animação. A pergunta que me vem é: Esta encenação pode ser considerada teatro de animação? É animação uma encenação que desiste de propor que a intenção parte do objeto? Se sim que tipo de acordo seria esse entre ator-animador e objeto? E, em última instância: Por que o objeto está ali? Seria este objeto o chocalho da pajelança propondo um retorno às origens da animação?

Sempre acreditei que a qualidade do animador consiste em o quão rapidamente ele angaria o acordo com a platéia de que a intenção parte do seu objeto. Obviamente me disponho a reavaliar este e todos os outros conceitos. Duvidar é preciso.
Mostrou-se um desafio constante e questionador a encenação que propomos no grupo A Roda de ‘Amor e Loucura’ onde os atores-animadores mostram seu rosto e se utilizam ora de alegorias, ora de objetos animados para contar uma história em si alegórica amontoando metáforas sobre metáforas e ainda poemas recitados em “off” que buscamos não ilustrar com as imagens oferecidas pelos objetos, cenário ou elementos de cena. Música, poesia, animação, tudo ocorre como se cada um destes elementos da encenação quisesse contar a história independentemente, ao mesmo tempo e sem reiterar-se. Muitas vezes a platéia parece saltar de um estímulo para outro buscando a melhor forma de compreender o enredo. Houve quem fechasse os olhos para apenas desfrutar dos poemas e houve quem decidiu não prestar atenção a eles estimulando-se visualmente. Um acordo acontece pela participação ativa do todas as partes envolvidas.

15.2.07

"...num oceano de brumas dividido entre a divina loucura e o amor transbordante."

"No princípio era o escuro vazio do sem nome e só o medo campeava no silêncio da treva."

http://vimeo.com/46956050

"Este, o que move a roda escura dos dias, dos teus dias."
"Que fina erosão esculpe meus sentidos."


"É da fêmea os abismos e as obscuras forças da terra, é da fêmea o segredo da chuva, do sêmen e o sal da colheita."

" Por que falar do amor, esse eterno suplício, mão que tateia a ausência de outra face?"


"O medo é o que me prende ao chão."



"As volutas de um buzio capturam o infinito e o horizonte é um círculo que, rápido, se fecha."


"Nenhuma presença é mais real que a falta e a solidão me curva como um arco."


"Como é doce o ruflar de asas na garganta
como é doce o roçar de penas no pescoço
o sonido do vôo
o sibilo da flecha(...)"

"Seguiremos juntos, teus dedos como setas apontam meu destino."



Amor e Loucura
direção artística e bonecos
olga gomes
manipulação
fábio pinheiro
marcus sampaio
olga gomez
stella carrozzo
roteiro original
grupo a roda
poemas e voz
myriam fraga
direção de cena
grupo a roda
rino carvalho
cenografia e figurino
fábio pinheiro
olga gomez
direção musical e execução da trilha
uibitu smetak
Espetáculo contemplado pelo
Prêmio Montagem de Médio Porte da Fundação Cultural do Estado da Bahía e pelo
Prêmio Funarte de Teatro Myriam Muniz com patrocínio da Petrobras


nesta postagem:
fotografias de luiz felipe
trechos dos poemas de myriam fraga

29.8.06

Algo de 'Amor e Loucura'

Gostaria de escrever diretamente sobre o novo espetáculo do grupo A Roda, mas estou por demais imbuído do processo. Deixo aquí um poema de Louise Labè ( traduzido, vou buscar o original em francês para quem gosta,
considero este poema um tanto mais de Sérgio Duarte) e outro de Myrian Fraga. É certo que, no espetáculo não há uma só linha dos escritos de Louise Labè ( pesquisamos a tradução de Felipe Fortuna, aproveitamos da poeta seissentista apenas algo do argumento). Convidamos a poetisa baiana Myrian Fraga para nos dar voz. Há que citar aquí o trecho de outro poema de Myrian Fraga que traduz as duas personagens principais da peça e nossa compreenção delas :

"Eu sou fragil e cruel
tu és manso e assassino"
(reservo aquí o lugar para citar o livro e o título do poema de Myriam Fraga os quais acabo de esquecer)


Vivo e morro e me afogo em chama ardente;
Sinto calor extremo e extremo frio
Meu caminho é, ora sombrio,
E em meio a grande pena estou contente.
Choro e me rio simultaneamente
E na alegria meu tormento expio;
Duradouro é meu bem, mesmo arredio,
Sou planta seca e ramo florescente.
Assim me leva Amor, sempre inconstante,
Pois quanto mais me doem minhas dores
Sem que perceba encontro alívio adiante.
Se do prazer, porém, gozo os favores
E se aproxima o desejado instante,
Amor me atira às penas anteriores.

Louise Labé
(Tradução de Sérgio Duarte)
Do livro: "Três Mulheres Apaixonadas", Companhia das Letras, 199, SP



Esta noite em Angico
a brisa é calma.
No silêncio farfalham minhas anáguas
Como farfalham asas
E no escuro minha carne cheira a mato.
Vem meu amor e lavra
Este roçado
Como quem quebra
Um cântaro,
Como que lava
A casa;
Águas frescas na tarde.
Tuas límpias carícias,
Teus dedos como pássaros
E teu corpo que arde
Como estrelas
No espaço.
Não quero tua candeia,
Só meus sonhos acesos
E eu te direi de nácar
Terciopelo,
Coisas antigas, pelo de leoa; voz de cego na feira,
Não quero teu braseiro,
Tua intensa cintilação que queima meus vestidos
Só quero a tua volta,
Tua presença
Iluminando a noite
Que me cerca
Como uma luz acesa
No postigo.
Que sabes de minha vida
Além da morte
Inquieta que me ronda?
Que sabe desta chita
Destes panos
Que envolvem minha nudez
Como uma chama?
São teu olhos carvões que me devoram,
São teus beijos
Fosforescências de mel,
Travo forte das frutas.
Teus dedos como setas
Apontam meu destino:
Meu caminho,
Na planta de teus pés;
Meu horizonte,
No risco de tuas mãos
E meus cabelos
Esparsos sobre a relva
Em que me habitas.
Sou teu medo, teu sangue,
Sou teu sono,
Tua alpercata
De couro,
Teu olho cego, miragem
Dos vidros
Com que miras
A mira do mosquete.
Sou teu sabre,
Facão com que degolas.
Sou o gosto de sal,
Veneno que espalharam
No prato.
Sou a colher de prata
Azinhavrada.
Sou teu laço
Teu lenço
No pescoço.
Sou teu chapéu de couro
Constelado
Com estrelas de prata
Sua a ponta
Do teu punhal buscando
O peito dos macacos.
Sou teu braço,
A cartucheira cruzada
Sobre o peito,
Sou teu leito
De angico e alecrim
Sou a almofada
Em que deitas a face,
O cheiro agreste
Dos homens que mataste.
sou a bainha
E a lâmina é meu resgate.
Sou tua fera.
Sussuarana
No escuro - bote e salto.
Jaguatirica acesa nestes altos
Mundéus de teu alarme.
Sou o parto
Da morte que te espreita.
Sou teu guia
Tua estrela, teu rastro, tua corja.
Sou tua mãe que chora,
Sou tua filha.
Teu cachorro fiel,
Tua égua parida.
Sou a roseta na carne,
O lombo nas esporas.
Sou montaria e cavalo,
Fúria e faca.
Ferro em brasa na espádua
Sou teu gado,
Tua mulher, tua terra,
Tua alma,
Tua roça.
Coivara
Que incendeias e apagas,
Tua casa.
Areia no sapato.
Sou a rede
Aberta como um fruto,
Sou soluço.
Fome escura
De poço.
Sou a caça
Abatida.
Lebre e gato,
Coisas quentes ao tato.
Vem, meu dono, meu sócio,
Meu comparsa.
Desarma o teu cansaço,
Desata a cartrucheira,
A noite é farta
Como besta no cio,
A noite é vasta.
Vem, devagar
E habita meu silêncio
Como se habita
Um claustro.
Lâminas.
Como espadas.
Pasto de aves meu corpo
Que trabalhas
Como quem corta e lavra.
Desata a cartucheira,
Teu campo de batalha
Sou eu.
Por um momento
Esquece o que te mata- fúria e falta -
E enquanto a noite é calma
Vem e apaga
Na pele do meu peito
Esta fome sem data.

Maria Bonita de Myrian Fraga